3/09/2011

Aquele que tem apenas passado, mas nenhum futuro,

A fogueira das vaidades, que arde nos corações daqueles que se acham donos do universo, está longe de ser extinta pelo bom senso das pessoas de bem. As personalidades afeitas ao narcisismo, à soberba e ao preconceito, pela reputação que adquirem, alimentada pela mídia e pelo sucesso que conquistaram, tendem a se considerar seres humanos muito superiores à imensa multidão de anônimos de todo o mundo. Estes, por sua vez, acompanham sempre o exagero das celebridades, para quem não existem limites. É claro que um basta a este tipo de comportamento existe, e um exemplo disso foi produzido na terça-feira passada, quando o estilista britânico John Galliano, de 50 anos, que se estava no topo do sucesso em sua carreira, escorregou e viu o seu mundo ruir de forma irreparável. O jornal francês “Le Monde” divulgou que a grife Christian Dior, uma das mais respeitadas do mundo, demitiu no dia 1º de março o estilista John Galliano, por causa das suas “declarações e condutas profundamente ofensivas”. (veja vídeo)

Do alto da sua posição de diretor criativo da maison desde 1996, Galliano caiu ao revelar o seu lado antissemita. O estilista foi acusado de racismo ao proferir vários insultos a um grupo no café “La Perle”, em Paris, fato atestado por um vídeo, gravado no fim de 2010. Sua posição na Christian Dior se tornou insustentável depois que a grife tomou conhecimento das imagens. No vídeo, Galliano declarou, embriagado: “Eu amo Hitler!”, uma frase obviamente infeliz. Dirigindo-se a várias pessoas, Galliano ainda vociferou: “pessoas como vocês estariam mortas hoje [se dependesse dele]. Suas mães, seus antepassados teriam sido mortos pelo gás”.

Galliano cometeu um “suicídio” pessoal e profissional. Uma prova disso foi a declaração da atriz Natalie Portman, um dia depois de receber o Oscar por sua atuação em “Cine Negro”. A atriz, que é estrela de um perfume da Christian Dior, além de judia israelense, foi contundente: “Estou completamente chocada e enojada com o vídeo de John Galliano que veio à tona hoje. Tenho orgulho de ser judia e não quero ser associada a ele de jeito nenhum. Eu espero que esses comentários nos levem a refletir e agir para combater esses preconceitos, que vão contra tudo o que é belo”. Constrangida, a grife comunicou na terça-feira que o estilista já estava em processo de demissão,. Foi a gota que faltava para John Galliano sugar a sua dose de cicuta diante do mundo inteiro. O estilista, daqui por diante, terá de começar a leitura dos jornais pelo caderno de classificados, para procurar um improvável emprego, porque dificilmente o conseguirá.

Já que, para a Dior, John Galliano é um morto-vivo, aquele que tem apenas passado, mas nenhum futuro, o que falará dele será uma autópsia midiática. De origem humilde, filho de um encanador inglês com uma espanhola, Galliano nasceu em Gibraltar, em 1960, formado pela concorrida “Saint Martin’s School of Art”, de Londres, de onde saíram estilistas como Alexander McQueen e Stella McCartney. Na quarta-feira, os amigos de Galliano agiram para interná-lo em uma clínica de reabilitação para viciados em álcool e drogas, mas, pelo jeito, a mídia já considera a sua morte profissional, como o “Le Monde”, que publica uma retrospectiva dos trabalhos do estilista.

Ou seja, sua história nos jornais é hoje uma versão surrealista de quem foi sem nunca ter sido, o obituário de um estilista vivo.

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